quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Motivos


Nos conhecemos em 2005 e entre tantas coincidências havia o desejo em comum de morar fora do país. Conhecer outra realidade, descobrir lugares novos, aprender outras línguas …
A verdade é que estávamos insatisfeitos com o que tínhamos aqui e queríamos ver como era lá fora.
Adoro minha cidade e meu povo, acho a cultura linda e indiscutivelmente riquíssima. O marido sempre sentiu muita falta de lá, da comida, da família, dos amigos de infância, de conhecer as ruas, da familiaridade com tudo, mas nunca conseguimos nos conformar com a forma como as coisas são feitas. Recife é uma cidade absurdamente quente, com sistema de transporte público ineficiente que de uns anos pra cá deixou acumular tanto a quantidade de carros que agora tem congestionamentos enormes, nunca vistos antes por lá. Em toda a cidade temos só dois parques públicos e tirando a praia, que agora tem tubarões, não existe nenhuma outra opção gratuita de lazer além de Shopping (se é que dá pra considerar isso como gratuito). A violência cresce cada vez mais e os preços e impostos também, e esses são só alguns exemplos, tem muito mais... Agora me diga, como não se questionar? Como não acabar pensando: deve ter algum lugar no mundo melhor que aqui... Algum lugar pra chamar de nosso, não que seja perfeito porque isso não existe, mas que seja melhor. E como não comparar?
Quando a gente amadurece, viaja, sai e conhece o mundo, fica tão mais complicado de se conformar e encarar a falta, falta de saúde pública comum e decente, de escola pública de qualidade para todos, de limpeza urbana, de organização e de tantas outras coisas e de fatores que é quase impossível fechar os olhos e dizer que está tudo bem. Quando vira normal escutar que fulano foi morto durante um assalto, ter que andar o tempo todo atracada com a bolsa, não poder andar tranquilo na rua, que a mensalidade da escola do seu filho vai passar dos 2 mil Reais enquanto o salário mínimo não chega aos R$ 700,00 e saber que tem muita gente que tem que viver só disso enquanto tem tantos outros que, com uma rotina de trabalho normal, ganha mais do que 25 mil/mês, que as pessoas estão morrendo nas filas dos hospitais esperando tratamento, que político corrupto é o padrão e que diferente é ser honesto, escutar que o morro de não sei onde desabou e morreram mais de 50 e que vamos lá todos felizes porque esse ano inaugura mais um shopping! Meu Deus, o que é isso?! As pessoas não estão vendo? Não estão sentindo? Ou é só a gente?
Desde pequena escuto falar "o Brasil é o país do futuro". Não duvido, deve ser mesmo, potencial a gente tem, e muito. Mas esse futuro ainda não chegou na geração dos meus pais, na minha, e duvido muito que chegue na dos meus filhos ou dos meus netos. Até lá é muita coisa ainda pra fazer, pra engolir e se o próprio povo acha que os fatores ruins são os esperados, quando é que isso vai acontecer?

Não estou dizendo que não temos nada de bom, temos uma alegria natural e esperança diante de tantos momentos difíceis, a simpatia, a humanidade, a solidariedade, são coisas que guardo comigo e das quais me orgulho em dizer que sou brasileira. As nossas belezas naturais, nosso país é lindo, variado e eclético em todos seus aspectos. Mesmo com os absurdos que vemos por aí ainda somos referência em aceitação, em miscigenação e esses são valores que pretendo repassar aos meus filhos, independente de localização. Mas quando tudo isso acaba ficando escondido atrás de tanta coisa ruim, fica difícil de ignorar.
Chega, cansamos. Esse é o nosso protesto, estamos indo embora. Não é isso que queremos pra nós, não é aqui que queremos ter filhos. Aliás, se dependesse da gente colocava todo mundo, pai, mãe, irmãos, avós, toda a família, todos os amigos, cachorro, num mesmo avião e íamos todos juntos para algum outro lugar! Ah se isso fosse possível...

O nosso problema na verdade era: mas pra onde? E fomos pesquisar.
Tereza

2 comentários:

  1. Gostei muitíssimo do seu texto, especialmente com o trecho:

    "o salário mínimo não chega aos R$ 700,00 e saber que tem muita gente que tem que viver só disso enquanto tem tantos outros que, com uma rotina de trabalho normal, ganha mais do que 25 mil/mês, que as pessoas estão morrendo nas filas dos hospitais esperando tratamento, que político corrupto é o padrão e que diferente é ser honesto, escutar que o morro de não sei onde desabou e morreram mais de 50 e que vamos lá todos felizes porque esse ano inaugura mais um shopping! Meu Deus, o que é isso?! As pessoas não estão vendo? Não estão sentindo? Ou é só a gente?"

    Me identifiquei muito, é exatamente isso que me pergunto...
    Seja bem-vinda ao mundo dos blogs, o processo de vocês é de quando?
    Abraços,
    Lidia.

    ResponderExcluir
  2. Oi Lídia, ai que bom que é receber comentários! E melhor ainda saber que tem mais gente que pensa como nós.
    Estamos há 21 meses de processo, acredita? Parece que não vai acabar nunca... Enviamos nossos exames médicos mês passado para Ottawa e eles já receberam, mas São Paulo ainda não deu sinal para mandarmos os passaportes. Aguardando... Aguardando... Aguardando...
    Abraços,
    Tereza

    ResponderExcluir